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07/07/2021

CYBERCRIMES – INTERNET NÃO É TERRA SEM LEI!

 

       Recente decisão condenou internauta a pagar indenização para político em razão de ofensas em rede social e trouxe diversas indagações sobre o assunto. O crescente número de usuários da internet fez com que aumentasse também a prática de crimes que usam o meio digital para praticá-los. Não necessariamente temos novos tipos penais para os crimes, pois temos principalmente um grande número de crimes contra a honra onde o meio social cibernético é utilizado para realizá-los.

       É sabido que o direito à livre manifestação do pensamento, previsto no art. 5º, inciso IV, da Constituição Federal, é uma garantia fundamental, porém não absoluta, devendo ser exercida de forma responsável, sob pena de configurar abuso de direito, uma vez que igualmente é assegurada, nos termos do mesmo dispositivo, em seu inciso X, a inviolabilidade da honra e imagem das pessoas, dispondo que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Por seu turno, a Constituição Federal também impôs o dever de reparar os danos advindos da violação ao direito à honra, como se observa no art. 5º, V: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.

       Sendo assim, observamos que a liberdade de expressão encontra limites na inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, devendo ser exercido com consciência e responsabilidade. Algumas expressões, de cunho ofensivo, podem configurar ofensa a honra subjetiva, gerando dever de indenizar mesmo não havendo publicidade (ou a publicidade sendo reduzida). A ampla circulação, com o atingimento de grande número de pessoas, não é condição para a configuração da responsabilidade civil, mas pode agravá-la.

       Temos também um crescente número de denúncias relacionadas a crimes sexuais e divulgação de pornografia, ou então a conhecida como “revenge porn” que é onde temos a divulgação da imagem alheia pela própria pessoa com quem o fotografado se relacionou afetivamente, como um ex-namorado, ex-companheiro, ex-noivo, ex-cônjuge ou, até mesmo, alguém com quem manteve algum contato superficial, mas tem motivos torpes para fazer tal disseminação não autorizada de imagem íntima.

      Nesse sentido, confira-se os seguintes julgados do E. Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL - Ação indenizatória por danos morais - Postagem ofensiva na rede social "Facebook" dirigida ao prefeito do Município - Sentença de improcedência - Apelo do autor - Acolhimento - Publicação com carga negativa e tom jocoso, extrapolando, assim, direito de crítica, inerente ao exercício da liberdade de expressão - Termos que não guardam correlação com o cargo de prefeito municipal - Direitos da personalidade atingidos - Danos morais devidos - "Quantum" indenizatório fixado em R$ 10.000,00 à luz das circunstâncias do caso e dos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da vedação ao enriquecimento sem causa Correção monetária pela tabela prática deste Egrégio Tribunal, a contar da publicação desta decisão (Súmula 362 do STJ) e juros de mora desde o evento danoso (Súmula 54 do STJ) - Além disso, a requerida de- verá se retratar, pela mesma rede social, por meio de nova publicação com o fito de se desculpar pelas agressões injustificadamente cometidas - Sentença reformada - Recurso provido. (TJSP, Apelação Cível nº 1001624-59.2018.8.26.0415, 8ª Câmara de Direito Privado, Rel. Clara Maria Araújo Xavier, j. 07/10/2020).

 

APELAÇÃO. Ação de reparação de danos morais c/c retratação. Publicação de ofensas pela internet contra prefeito local. Postagens de caráter pessoal, pejorativo e malicioso que em muito extrapolam o viés político. Aborrecimentos, mácula à honra e inequívoca repercussão na cidade dos fatos que em muito extrapolam o reles dissabor. Dever de reparação moral bem detectado. Quantum indenizatório todavia fixado em excesso (R$ 30.000,00). Minoração. Pertinência. Arbitramento em R$ 10.000,00 que melhor atende ao efeito pretendido. Dever de retratação. Pedido expressamente formulado pela parte autora. Ratificação que se impõe. Sentença reformada em parte. Adoção parcial do art. 252 do RITJ. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSP, Apelação Cível nº 1013007-15.2017.8.26.0562, 5ª Câmara de Direito Privado, Rel. JAIR DE SOUZA r, j. 17/09/2019).

 

       Outro caso que recebeu destaque na mídia foi a decisão que foi provocada por ação movida por Melhem após o youtuber escrever em seu perfil no Twitter a seguinte mensagem: "Não caiam nesse discursinho de merda do Marcius Melhem. Esse cara é um criminoso, um escroto, um assediador que merece cadeia por todo sofrimento que causou".

       Ao analisar a matéria, o magistrado entendeu que as expressões "criminoso" e "assediador" não foram utilizadas no sentido técnico- jurídico que essas palavras podem apresentar e conotam um sentido claramente ofensivo, relevando a vontade de negativamente censurar o comportamento de Melhem em um grau considerável. "A liberdade de expressão, que a Constituição de 1988 a todos garante, é de ser exercida dentro de limites razoáveis inerentes a exprimir uma opinião, quando não se revele excesso no emprego e sentido de palavras, termos e contexto designadamente ofensivos como aqueles que o réu empregou, sem qualquer razão ou motivo que isso justificasse, ou pudesse escusar a conduta do réu em escrever e publicar um texto que, dotado de poucas linhas, era todo ofensivo à honra pessoal e profissional do autor", ponderou o juiz.

        Em casos como esse a reparação por dano moral não tem relação imediata com uma ideia patrimonial, mas com critérios como o grau da ofensa praticada, seus efeitos e o público alcançado. Além de condenar Castanhari a indenizar Melhem em R$ 100 mil, o julgador também determinou que o youtuber publique em "todas as suas redes sociais informação acerca do conteúdo desta sentença, para que seus 'seguidores' tenham conhecimento de que o réu suportou condenação nestes autos".

        A defesa de Castanhari emitiu nota sobre o caso alegando que há nulidade do processo, já que o juiz não aceitou a produção de prova testemunhal oportunamente requerida, recusando também o pedido de que fosse obtida cópia da sentença favorável à Revista Piauí, em um processo sigiloso movido pelo Marcius Melhem contra a revista. Entende também que os valores fixados a título de danos morais são desproporcionais, considerando a natureza do caso e a jurisprudência uníssona do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça de São Paulo. Por fim, a defesa acredita que Felipe exerceu regularmente o seu direito de liberdade de expressão e de manifestação do pensamento, tendo agido unicamente com a intenção de defender a amiga, atriz e apresentadora Dani Calabresa e está confiante de que a sentença de primeiro grau não será mantida nas instâncias superiores.

 

 

Natasha Japur

OAB/RS 98.400

Advogada Criminalista

 

 


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05/07/2021

As particularidades da Recuperação Judicial para o Produtor Rural: facilidade no ajuizamento, mas limite de créditos abrangidos

A Lei 11.101/2005 estabeleceu as diretrizes para a recuperação judicial, a qual é um procedimento que permite ao devedor a renegociação coletiva do seu passivo, a fim de combater a crise econômico-financeira instaurada[1].

 

O referido ordenamento determinava que para adentrar à recuperação judicial era necessário apresentar a certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas, conforme estabelece o inciso V, do artigo 51[2].

 

Contudo, a lei não especificava qualquer tratamento diferenciado ao produtor rural, que acabava por ser submeter à determinação do artigo anteriormente mencionado. Porém, é consabido que os empresários do ramo rural exercitam a sua profissão de maneira diferenciada, devendo, portanto, ter um tratamento diferenciado.

 

Nesse aspecto, o antigo ordenamento acabava por limitar o acesso do Produtor Rural ao instituto da Recuperação Judicial, uma vez que a inscrição no Registro Público de Empresas é requisito necessário para acesso ao Sistema Recuperacional, por um período de pelo menos 2 (dois) anos.

 

Com o advento da Lei 14.112, de 24 de dezembro de 2020, os produtores rurais, que atuam como pessoa física, podem requerer recuperação judicial. Para tanto, os produtores precisam comprovar apenas o desempenho de atividades rurais há pelos menos 2 (dois) anos, pela apresentação dos documentos elencados no artigo 48, parágrafo 3º, da referida lei.

 

Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:

[...]

§ 3º Para a comprovação do prazo estabelecido no caput deste artigo, o cálculo do período de exercício de atividade rural por pessoa física é feito com base no Livro Caixa Digital do Produtor Rural (LCDPR), ou por meio de obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir o LCDPR, e pela Declaração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF) e balanço patrimonial, todos entregues tempestivamente.

 

A inclusão do produtor rural, pessoa física, na lei de Recuperação Judicial e Falência, solidifica o entendimento firmado pelo judiciário, haja vista que, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, na decisão da Terceira Turma[3], entendeu que as dívidas contraídas pelo produtor rural, antes da sua inscrição perante a Junta Comercial, poderiam ser incluídas na recuperação judicial.

 

Após obter o registro e passar ao regime empresarial, fazendo jus a

tratamento diferenciado, simplificado e favorecido quanto à inscrição e aos efeitos desta decorrentes (CC, arts. 970 e 971), adquire o produtor rural a condição de procedibilidade para requerer recuperação judicial, com base no art. 48 da Lei 11.101/2005 (LRF), bastando que comprove, no momento do pedido, que explora regularmente a atividade rural há mais de 2 (dois) anos. Pode, portanto, para perfazer o tempo exigido por lei, computar aquele período anterior ao registro, pois tratava-se, mesmo então, de

exercício regular da atividade empresarial.

 

Entretanto, o parágrafo mencionado é restrito ao Produtor Rural e não se aplica aos demais empresários em busca de soerguimento, como sabiamente propõe SACRAMONE:

 

[...] a interpretação do dispositivo legal deve ser restrita ao produtor rural e não aos demais empresários.

Desta forma, nos termos da lei, ao produtor rural não basta, em sua petição inicial, expor as causas concretas da situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira. O produtor especificamente deverá demonstrar sua crise de insolvência, caracterizada pela insuficiência de recursos financeiros ou patrimoniais com liquidez suficiente para saldar suas dívidas. [4]

 

Outrossim, apesar de facilitar a utilização do instituto da Recuperação Judicial por parte do Produtor Rural, a Lei 14.112, de 24 de dezembro de 2020 limita os créditos que podem ser inscritos no procedimento.

 

Nesse aspecto, com a nova atualização somente estão sujeitos à Recuperação Judicial os créditos decorrentes exclusivamente da atividade rural, desde que devidamente comprovados nos registros.

 

Além disso, as dívidas oriundas do crédito rural poderão ser abrangidas, desde que não tenham sido objeto de renegociação entre o devedor e a instituição financeira, antes do pedido de recuperação judicial. 

 

Do contrário, as dívidas que tinham como finalidade a aquisição de propriedade rural, bem como as suas respectivas garantias, se constituídas nos último 3 (três) anos anteriores ao pedido de recuperação, não poderão ser incluídas no processo, o que limita o alcance do processo de Recuperação do Produtor Rural.

 

Essas limitações acabam por prejudicar o Ruralista, restringindo a abrangência dos créditos e, consequentemente, obstaculizando o pleno soerguimento do empreendedor rural.

 

 

Luiza Costa Pinto

OAB/RS 116.749

Advogada do Departamento

de Recuperações Judiciais

 

[1] SCALZILLI, João Pedro; SPINELLI, Luis Felipe; TELLECHEA, Rodrigo. Recuperação de Empresas e Falência, pág. 119. 3ª Ed, São Paulo: Almedina, 2018.

[2]Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com:

[...]

V – certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas, o ato constitutivo atualizado e as atas de nomeação dos atuais administradores.

[3] REsp nº 1.800.032-MT. Acesso disponível em: https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1832496&num_registro=201900504985&data=20200210&formato=PDF

[4] SACROME, Marcelo Barbosa. Comentários à Lei de recuperação de empresas e falência, pág. 302. 2ª Ed – São Paulo: Editora Saraiva, 2021.


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02/07/2021

O ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL E OS CRIMES TRIBUTÁRIOS

O denominado “pacote anticrime”, de 2019, dentre as várias modificações no nosso ordenamento jurídico, trouxe em seu artigo 28-A do Código de Processo Penal o acordo de não persecução penal, a ser proposto antes da propositura da ação penal. Não há nada tão inovador quanto parece, pois já era há muito falado e inclusive modificado nas resoluções do Conselho Nacional do Ministério Público. O acordo é cabível em crimes sem violência ou grave ameaça, com pena mínima inferior a 4 anos onde haja confissão do fato pelo agente. Deve ser proposto quando o Ministério Público julgar necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime.

 

Tal afirmação sobre “necessário e suficiente” nos traz uma falsa impressão de discricionariedade não é mesmo? Afinal, o juiz também tem o poder de rejeitar o acordo quando considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições impostas no ajuste. A problemática não está na possibilidade de rejeição do acordo, mas sim de tais limites não serem delineados. Notamos aqui, em função do caráter de “pena” do acordo, uma semelhança com o art. 59 do CP que exige que a imposição seja necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime e, portanto, a competência do juiz para examinar.

 

            Além dos requisitos já citados, o acordo só é proposto pelo Ministério Público mediante as seguintes condições (ajustadas cumulativa e alternativamente):

 

I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Código Penal);          

IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Código Penal, a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

 

Conforme o § 2º, I, II, III e IV do mesmo artigo(28-A), o acordo não será admitido se for cabível a transação penal (outra espécie de acordo - lei nº 9.099/95); ou se o investigado for reincidente ou houver indícios de que pratique crimes de forma habitual ou profissional – exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; se o agente tiver sido beneficiado nos últimos 5 anos por transação, suspensão condicional do processo ou acordo de não persecução penal; ou, por fim, se o crime for praticado no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou contra a mulher por razões da condição de sexo feminino.

 

O acordo de colaboração será formalizado por escrito e o investigado deve estar acompanhado de advogado em audiência na qual o juiz verificará a sua voluntariedade e regularidade, tomando a oitiva do agente. Caso haja homologação pelo juiz das garantias, os autos serão devolvidos ao parquet para que se inicie a execução perante o juízo de execução penal e após o cumprimento integral dos termos do acordo, será extinta a punibilidade do agente.

 

            A celebração do acordo não constará na certidão de antecedentes criminais (salvo registro para evitar que o mesmo agente seja beneficiado novamente pelo instituto em um prazo inferior a 5 anos como consta no § 12). Na hipótese de descumprimento do acordo, o Ministério Público deve comunicar o fato ao juízo para fins de rescisão e posterior oferecimento de denúncia. Além disso, o descumprimento pode ser utilizado como justificativa para eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo.

 

O prazo prescricional não corre enquanto não cumprido ou rescindido o acordo de não persecução penal, de forma que não há risco de ocorrer prescrição nestes casos, ao contrário do que ocorre na transação penal. Havendo discordância do magistrado quanto aos termos do acordo, por entendê-lo abusivo, insuficiente ou inadequado, os autos serão devolvidos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com a concordância do investigado e seu defensor (§ 5º). E se o Promotor não concordar com a revisão dos termos originais temos duas opções: recorrer da decisão, através de Recurso em Sentido Estrito, ou simplesmente não proceder à alteração, quando então o magistrado recusará a homologação do acordo e devolverá os autos, para que o Ministério Público analise se há necessidade de complementação das investigações, ou ainda se é o caso de oferecimento de denúncia (§ 8º). O parquet pode também requerer o arquivamento da investigação, na oportunidade, caso em que determinará as providências previstas no art. 28 do CPP.

 

Caso o investigado entenda que faz jus ao acordo de não persecução, mas a proposta não tenha sido feita pelo Ministério Público poderá haver requerimento de remessa dos autos ao órgão superior, na forma do art. 28-A do Código de Processo Penal (§ 14). A vítima será intimada da homologação do acordo e de seu eventual descumprimento (§ 9º), bem como o MP deverá comunicar ao juízo qualquer descumprimento das condições estipuladas, para sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia, podendo também não oferecer a suspensão condicional do processo em razão do descumprimento (§ 11).

 

 

Considerações quanto aos crimes tributários:

 

Na Lei nº 8.137/1990 temos a definição de crimes contra a ordem tributária, como por exemplo a supressão ou redução de tributos por meio de omissão, fraude, falsificação, não fornecimento de documentos obrigatórios, bem como apresentação de declarações falsas, não recolhimento de tributo ou contribuição social descontada etc. As penas mínimas não ultrapassam quatro anos, então se preenchidos os demais requisitos objetivos e subjetivos, estarão hábeis à realização do acordo.

 

Entretanto, nesses crimes não observamos benefícios para o investigado/acusado, pois apesar de formalmente adequado há soluções menos onerosas. Mesmo gerando a extinção da punibilidade a lei 8.137 tem em seu regramento instituto mais benéfico: Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137/90, e na Lei nº 4.729/65, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.

 

Sendo a reparação do dano para o acordo o pagamento integral do débito tributário, e essa condição cumulada com qualquer outra, que é a uma realidade nos acordos, já seria desinteressante quando se pode somente pagar para que se extinga a punibilidade. Mesmo na hipótese de parcelamento, o acordo também é inviável. A redação do art. 9º da Lei 10.684/2003 determina:

 

Art. 9º. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do  Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.

§ 1º. A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.

§ 2º. Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.

 

No mesmo sentido, a redação dada pela Lei nº 12.382/2011 ao art. 83 da Lei nº 9.430/1996 reafirma que quando há parcelamento do débito tributário nos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei no 8.137/90 e crimes contra a Previdência Social, dos arts. 168-A e 337-A do Código Penal, a pretensão punitiva estatal ficará suspensa, e, quando pago integralmente o valor, a punibilidade será extinta:

 

§ 1º. Na hipótese de concessão de parcelamento do crédito tributário, a representação fiscal para fins penais somente será encaminhada ao Ministério Público após a exclusão da pessoa física ou jurídica do parcelamento;

§ 2º. É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal;

§ 3º. A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva;

§ 4º. Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento;

§ 5º. O disposto nos §§ 1o a 4o não se aplica nas hipóteses de vedação legal de parcelamento;

§ 6º. As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não recebida a denúncia pelo juiz.

 

O Supremo Tribunal Federal adota a posição de que o pagamento do tributo feito a qualquer tempo extingue a punibilidade do crime tributário, bem como a concessão do parcelamento tributário devidamente quitada também extinguirá (HC 116.828/SP, DJ 13/08/2013). O Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentido, defendeu a posição, dizendo:

 

(…) não há como se interpretar o artigo 9º, § 2º, da Lei 10.684/2003 de outro modo, senão considerando que o adimplemento do débito tributário, a qualquer tempo, até mesmo após o advento do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, é causa de extinção da punibilidade do acusado (HC 362.478/SP, DJe 20/09/2017).

 

O art. 9º da Lei n.° 10.684/2003 continua em vigor?

SIM! O pagamento do tributo a qualquer tempo extingue a punibilidade do crime tributário. O art. 9º da Lei n.°10.684/2003 não foi revogado e continua em vigor. Ao contrário das Leis 11.941/2009 e 12.382/2011 a Lei n.°10.684/2003 trata de pagamento direto (e não de pagamento após parcelamento). Assim o pagamento integral implica a extinção da punibilidade por força do § 2º do art. 9º da Lei 10.684/2003.

 

Na realidade a repressão penal nos crimes contra a ordem tributária nada mais é que uma forte forma de execução fiscal. A lei privilegia o recebimento do valor devido pelo contribuinte, em detrimento da imposição de pena corporal. Assim, não se pode restringir a aplicabilidade da norma despenalizada e condicionar o pagamento a determinado marco temporal.

 

Com tais constatações, apesar do cabimento, o ANPP não seria uma opção viável na prática, já que o pagamento a qualquer tempo ou parcelamento (também cabível a qualquer tempo, inclusive após o trânsito em julgado) extinguirá a punibilidade. Podemos também ver pela ótica de que, impondo ao acusado a condição de quitação do débito para lavratura de ANPP, e essa ocorrendo, nada mais pode ser exigido, podendo concluir que a quitação integral do débito exigido pela Fazenda Pública é incompatível com quaisquer outras condições para a formação de ANPP. Tratamento diferente implicaria, em tese, na conduta do artigo 30 ou do 31 da Lei de Abuso de Autoridade, seja por defender punição que deve saber indevida, seja por dificultar a conclusão de procedimento penal.

 

O que nos faz mais sentido visando compatibilizar os institutos é que o débito deve se limitar ao valor do tributo, em seu montante principal, corrigido monetariamente. É possível, por exemplo, que a reparação do dano não envolva a extinção total do crédito tributário (artigo 156 do CTN), isto é, que se limite ao pagamento do tributo e, no máximo, da correção monetária do período, excluindo-se juros e penalidades. Nesse caso em que não há a extinção total do crédito tributário também não há a extinção da punibilidade, permanecendo legítima a persecução penal ou o ANPP. Dentro dessa proposta o dano é reparado com o acordo (pagamento do principal e da correção), mas o saldo (juros e multas) continua exigível na esfera tributária.

 

Sendo assim, conclui-se que o ANPP tem uma finalidade muito mais ampla do que comumente vemos, podendo ser aplicado nos casos de crimes tributários de forma a reparar tanto integralmente o dano, quanto parcialmente, corrigindo o valor ao valor do tributo.

 

O Escritório Crippa Rey Advogados está à disposição para orientá-los, bem como para sanar quaisquer dúvidas existentes envolvendo o debate.

 

 

Porto Alegre, 02 de julho de 2021.

 

Natasha Japur

OAB/RS 98.400

 

 


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30/06/2021

A possibilidade de redução do percentual de Cláusula Penal avençado em contrato/acordo considerada excessivamente abusiva a um dos firmatários

O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atento às decisões advindas do Poder Judiciário, bem como no sentindo de auxiliar nossos clientes a enfrentar o período conturbado que assola o país no momento, vem apresentar informativo atinente à possibilidade de revisão de cláusula penal relativa à inadimplemento em caso de atraso no pagamento de parcelas avençadas em contratos e acordos.

 

É sabido que, quando há a pactuação, seja em Contratos diversos, como em acordos entabulados para resolução de questões de forma amigável, há a previsão do instituto da Cláusula Penal[1], ou seja, estipulação de percentual a ser incidido sobre os valores que não forem pagos na data prevista para tal, como forma de coibir o inadimplemento, dar segurança ao Contrato e indenizar o credor pelos valores não havidos no prazo estipulado previamente. 

 

Legalmente, o Código Civil Brasileiro prevê que a Cláusula Penal não pode estipular valor igual ao objeto do contrato, ou seja, deve ser pactuada de forma ponderada, de forma que não ultrapasse o valor total previsto na pactuação prevista entre as partes, nos seguintes termos:

 

Art. 412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.

 

Sabe-se que, usualmente, quando transacionado pelas partes a firmação de contrato ou acordos, usualmente a cláusula penal não costuma ultrapassar o percentual de 10%, normalmente em relação ao saldo restante.

 

Contudo, algumas pactuações, em que pese, na teoria, sejam firmadas de comum acordo entre os acordantes, ficam maculadas de onerosidade excessiva no tocante à Cláusula Penal, fixando percentuais demasiadamente elevados, o que tornam o Contrato desproporcional na hipótese de inadimplemento parcial ou atraso no pagamento de algumas parcelas, quando há divisão do pagamento a prazo.

 

E nessa seara, também há previsão da letra legal do Código Civil, que prevê que a discussão do Contrato ou Acordo quando levado ao judiciário, cabendo ao magistrado avaliar o equilíbrio contratual do firmado entre as partes, nos termos do art. 413, da Lei 10.406 de 2002:

 

Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

 

Dessa forma, é evidenciada a disparidade nos Contratos e Acordos, quando expostos ao juízo para discussão, quando há abusividade baseada na onerosidade excessiva da Cláusula Penal prevista em contrato quando arbitrada, por exemplo, em patamares próximos a 20% do saldo restante. Nota-se que, a depender do valor objeto do contrato o valor resultará em monta de valor elevado.

 

Nessa seara, sabe-se que a multa moratória é uma penalidade contratual que visa compelir o devedor ao pagamento da dívida no termo e no vencimento previamente acordados, como uma forma de coação ao cumprimento da obrigação pactuada.

 

No entanto, muito embora haja a manifestação da autonomia privada nas relações jurídicas, o que viabiliza a estipulação pelas partes das regras que regulem os seus próprios interesses, certo é que a multa moratória não pode ser estipulada em um valor que configure um enriquecimento sem causa.

 

Assim, em muitos casos, o Poder Judiciário acaba por, mitigando as disposições previstas em contrato, por minorar cláusulas manifestamente abusivas e desproporcionais para que ambas as partes se coloquem em posição igualitária no procedimento.

 

No sentido de exemplificar casos em que houve a redução proporcional da multa relativa à Cláusula Penal em contratos, há entendimento neste sentido em julgamentos proferidos pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

 

APELAÇÃO CÍVEL. LOCAÇÃO COMERCIAL. RESOLUÇÃO ANTECIPADA DA AVENÇA, DECORRENTE DE INADIMPLÊNCIA. MULTA COMPENSATÓRIA. REDUÇÃO PROPORCIONAL, NOS TERMOS DO ARTIGO 413 DO CÓDIGO CIVIL. CABIMENTO. SENTENÇA CONFIRMADA. RECURSO DESPROVIDO.

(Apelação Cível N.º 70072489586, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relatora: Ana Maria Nedel Scalzilli, Julgado em 28/09/2017)

 

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONFISSÃO DE DÍVIDA. REDUÇÃO DA MULTA MORATÓRIA PARA 10%. ARTIGO 413 DO CÓDIGO CIVIL. A estipulação de multa moratória deve ser razoável e proporcional ao inadimplemento, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio. Revelando-se excessiva e manifestamente onerosa a cláusula estipulada no contrato, cumpre ao Juiz adequá-la aos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade. Caso concreto em que o devedor não adimpliu a dívida, e o credor, ora apelante, promoveu execução de título extrajudicial contra os avalistas. Possível a redução da cláusula penal de 30% para 10% do valor do débito, medida que se apresenta adequada, de modo a punir o inadimplemento, sem acarretar, por outro lado, o enriquecimento sem causa do credor.

(TJ-RS - AC: 70051855583, Relator: Luiz Renato Alves da Silva, Data de Julgamento: 15/05/2014, Décima Sétima Câmara Cível).

 

Dessa forma, as partes acordantes sempre deverão atentar-se para provisionar parâmetros de cláusulas que comportem paridade de obrigações entre os firmatários. Contudo, sabendo-se da necessidade de, muitas vezes, readequar as Cláusulas que acabem por incidir em percentuais manifestamente abusivos, há a hipótese de judicialização da questão, buscando-se a consideração do Poder Judiciário para estipular tal equilíbrio previsto legalmente.

 

O Escritório Crippa Rey Advogados se coloca à inteira disposição para maiores consultas sobre o tema e avaliação de eventuais casos concretos de seus clientes e parceiros acerca da matéria atinente, eis que se trata de assunto que poderá trazer consigo peculiaridades específicas em cada caso concreto.

 

 

Paula Bortoli de Souza

OAB/RS 121.676

 

[1] Art. 408. Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.


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28/06/2021

GESTÃO E PLANEJAMENTO PATRIMONIAL SUCESSÓRIO E FAMILIAR

Muito se fala em planejamento sucessório, mas você sabe o que é, qual sua aplicabilidade e objetivo?

Bom, esse e outros questionamentos, nesse mesmo sentido, é o que tentaremos esclarecer nessas breves linhas.

Sabemos que os pilares do nosso Direito Sucessório são a família e o patrimônio. Ocorre que, em razão das inúmeras transformações que sofreram ao longo dos anos, podemos afirmar que o direito das sucessões está em total descompasso com a sociedade atual.

O sistema sucessório brasileiro é engessado e não permite autonomia dos envolvidos, pois os instrumentos fornecidos pelo Código Civil são insuficientes para atender às demandas da sociedade.

Só por esse primeiro motivo se demostra a importância e necessidade de se executar um adequado planejamento sucessório, eis que pode propiciar outras ferramentas para melhor se transmitir a vontade do autor da herança.

Mas podemos ir além, pois entre as inúmeras questões não abarcadas pelo Código Civil, está a possibilidade, de uma pessoa constituir várias uniões ao longo da vida e ter filhos em cada uma dessas uniões. Pode ocorrer, ainda, que após um longo período de união estável, venha a casar-se com outra pessoa, que não o companheiro de longo tempo. Todas essas alternativas têm fortes repercussões sucessórias, mas se formos pelas linhas estabelecidas pelo atual Código Civil, as alternativas são escassas e, muitas vezes, não atendem aos anseios e necessidades dos envolvidos.

Não bastasse essas questões apresentadas, antigos problemas afligem os herdeiros, dificultando, e muitas vezes inviabilizando, a regularização da sucessão causa mortis, como o alto custo dos impostos de transmissão, de certidões e escrituras necessárias para o deslinde do patrimônio inventariado.

Podemos falar, ainda, no descompasso e atual questionamento sobre a legítima, também denominada reserva, que é a parte dos bens deixados pelo falecido, que a lei assegura aos herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e o cônjuge/companheiro). A lei sucessória não nos apresenta uma solução satisfatória para muitas situações familiares-patrimoniais vivenciadas atualmente e a sua observância, em alguns casos, pode causar inúmeras injustiças e até desamparo de algumas pessoas de extrema importância para o círculo familiar.

A sociedade atual nos brinda com uma multiplicidade de demandas e transformações diárias e, quando estamos inseridos no escopo familiar – patrimonial – sucessório, não podemos permitir que o propósito e necessidade das pessoas se submetam as vontades do legislador, que permanece apegado a métodos e sistemas antigos, pois o que verdadeira e juridicamente deve ser respeitado e analisado é a autonomia privada de vontade dos envolvidos, que exige cada vez mais respeito, aceitação e adequação.

E é nesse contexto que o planejamento sucessório nos brinda, pois claramente é a melhor e mais eficaz ferramenta para gerenciamento e transmissão do patrimônio, sendo possível atender os interesses do titular dos bens e seus sucessores nas mais diversas configurações familiares e empresariais possíveis.

Através de instrumentos jurídicos diversos dos tradicionais, podemos diminuir, ou afastar totalmente, os inúmeros entraves presentes nos procedimentos de transmissão patrimonial previstos em lei.

Podemos citar algumas ferramentas jurídicas disponíveis e altamente eficazes para um correto planejamento familiar, senão vejamos:

  1. escolha ou alteração de outro regime de bens no casamento ou na união estável, até mesmo além do rol previsto no Código Civil;
  2.  constituição de sociedades, holdings familiares, para a administração e até partilha de bens no futuro; 
  3. realização de atos de disposição de vida, como doações, com possibilidade de reserva de usufruto;
  4. testamentos, com as cláusulas restritivas de incomunicabilidade, impenhorabilidade e inalienabilidade, se necessário; 
  5. realização de partilhas em vida e de cessões de quotas hereditárias após o falecimento; 
  6. contratação de previdências privadas abertas, seguros de vida e fundos de investimento.

Portanto, não existe uma regra geral para a gestão e realização de um adequado planejamento sucessório. Primeiramente, será necessário, um estudo aplicado e minucioso da estrutura familiar e do patrimônio, ou seja, do perfil das pessoas que compõem a família e de seu patrimônio e, após a indicação da solução jurídica que melhor se encaixa no caso apresentado.

Sendo assim, através da atuação interdisciplinar e expertise dos setores de família, sucessões, empresarial, societário e tributário, o Crippa Rey Advogados, poderá estruturar e desenvolver o melhor e mais adequado Planejamento Sucessório para você e sua família.

 

 

Priscila Gomes Pereira Salerno

OAB/RS 87.441


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25/06/2021

A IMPLEMENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS DIGITAIS NAS EMPRESAS E A VALIDADE JURÍDICA

A revolução digital não é novidade no cenário do setor empresarial, uma vez que tem modificado a forma de otimizar os processos e de reduzir custos dentro das empresas, sendo uma das principais mudanças a adoção de documentos digitais ou eletrônicos.

Com relação ao âmbito trabalhista, fala-se de documentação digital quanto aos contratos de trabalho, cartões-ponto, contracheques, entre outros, uma vez que é essencial que essa documentação seja firmada por cada empregado.

Os documentos digitais permitem uma drástica redução do consumo do papel, o que permite à empresa atuar com mais sustentabilidade, além de haver uma facilidade na organização e no arquivamento de documentos que não necessitam mais constar no banco de dados da empresa, observadas as determinações da Lei Geral de Proteção de Dados – Lei nº 13.709/18[1].

A principal dúvida das empresas quanto a adoção de um sistema inteiramente digital é se essa documentação possui ou não validade jurídica.

É importante dizer que os documentos digitais não se confundem com os documentos meramente digitalizados, uma vez que os documentos digitalizados são originalmente físicos.

No que diz respeito a simples digitalização dos documentos, em 2020, foi publicado o Decreto nº 10.278, que estabelece os requisitos para a digitalização de documentos públicos ou privados, a fim de que os documentos digitalizados produzam os mesmos efeitos legais dos documentos originais. Portanto, desde que observados os requisitos estabelecidos pelo Decreto, os documentos digitalizados terão a mesma força, efeitos, e validade dos documentos originais.

O documento digital, por outro lado, é emitido de forma inteiramente eletrônica, através de assinatura eletrônica, que é basicamente um código pessoal e irreproduzível que garante a não ocorrência de fraude de documentos. Ela também possibilita o reconhecimento da origem do documento e quem o elaborou, garantido a segurança e a integridade das informações contidas nele.

Um fator importante para determinar se um documento digital possui validade jurídica ou não é a adoção de um certificado digital válido, conforme determina a Lei nº 14.063/20, que dispõe sobre a validade do documento eletrônico através da certificação digital pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira ou de assinatura eletrônica avançada: a que utiliza certificados não emitidos pela ICP-Brasil ou outro meio de comprovação da autoria e da integridade de documentos em forma eletrônica, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.

O Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao Direito do Trabalho, dispõe, em seu artigo 439, que a utilização de documentos eletrônicos no processo é permitida. A jurisprudência também vem aceitando documentos eletrônicos como prova válida e eficaz nos processos.

Quanto a adoção de contracheques eletrônicos, por exemplo, a CLT determina, no art. 464, que o pagamento do salário deverá ser efetuado contrarrecibo, assinado pelo empregado, bem como que terá força de recibo o comprovante de depósito em conta bancária, aberta para esse fim em nome de cada empregado.

Portanto, na prática, se o pagamento do salário do trabalhador for realizado via depósito em conta e com o seu consentimento, apenas o comprovante de depósito já é válido como recibo de comprovação. Isto significa que não existe a necessidade de o empregador realizar a impressão de toda essa documentação para a colheita de assinatura dos empregados.

Em razão disso, é totalmente possível que a empresa colha a assinatura do empregado por meio digital, desde que as partes estejam em comum acordo. Além disso, os certificados de assinatura eletrônica também são disponibilizados as pessoas físicas, o que pode ser adotado pela empresa nesses casos.

Ainda, é importante que as Convenções Coletivas de Trabalho versem sobre o assunto, a fim de orientar os empregadores sobre estas e outras diretrizes, de forma a tê-las como respaldo na hora de elaborar a suas políticas internas de documentação eletrônica/digital.

Portanto, verifica-se que a adoção de um sistema digital tem levado as empresas a outros patamares e vem crescendo de forma exponencial nos últimos anos, uma vez que não se trata de mero impacto na desburocratização e na gestão de documentos das empresas, mas também na adoção de um modelo mais sustentável, com a redução de custos, porque reduz significativamente a impressão de documentos em papel.

Por fim, colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para dúvidas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outros esclarecimentos.

 

Porto Alegre, 25 de junho de 2021.

 

 

Jéssica Veroneze Duarte

OAB/RS 118.221

Advogada – Departamento Trabalhista

 

[1] Ver publicação: A LGPD e os Reflexos nas Relações De Trabalho, publicada em 26/05/2021. Disponível em: <http://www.crippareyadvogados.com.br/publicacao/a-lgpd-e-os-reflexos-nas-relacoes-de-trabalho>


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23/06/2021

PROPOSTA DE TRIBUTAÇÃO DOS LUCROS E DIVIDENDOS

O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atentos às inovações legislativas e regulamentares, vem apresentar informativo referente a proposta de tributação do lucro e dividendos.

 

Para compensar a queda de arrecadação com a alteração da tabela de isenção do Imposto de Renda para R$ 2,4 mil, o Ministério da Economia estuda aumentar em 20% a tributação de lucros e dividendos.

 

Desde 1996, o país adotou a isenção da distribuição de lucros e dividendos (art. 10 da Lei n° 9.249/95). Atualmente, as empresas pagam sobre o lucro apurado 15% de IRPJ, mais 9% de CSLL. Há ainda o adicional de IR de 10% o que perfaz o total de 34%.

 

Essa lei determina que os lucros e dividendos pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas não ficam sujeitos à incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte. Portanto, hoje, as empresas do Lucro Presumido, Lucro Real e Simples Nacional podem fazer a distribuição de todo o lucro sem precisar pagar absolutamente nada sobre isso.

 

Ao longo dos anos muitas tentativas de aprovar a tributação dos lucros foram feitas dentro do Congresso Nacional, nenhuma delas com sucesso. Contudo, tramita desde 2018 na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 9636/2018.

 

Essa semana, no dia 21/06/2021 o ministro da Economia, Paulo Guedes, decidiu propor a volta da tributação do lucro e dividendos com uma alíquota de 20%. A alíquota é maior do que os 15% inicialmente previstos para compensar a perda de arrecadação que o governo terá com o aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) de R$ 1,9 mil para R$ 2,4 mil.

 

A tributação do lucro e dividendos (parte do lucro da empresa distribuída entre acionistas) terá uma faixa de isenção de R$ 20 mil por mês. O governo também vai reduzir de 25% para 20% a alíquota de Imposto de Renda Pessoa Jurídica. A ideia é fazer essa redução em dois anos, mas setores empresariais já pressionam para que a queda da alíquota ocorra de uma única vez.

 

Na visão da área econômica, a ideia é desonerar as faixas mais pobres, reduzir o imposto de empresas e aumentar um pouco mais a carga dos que realmente têm condições de pagar.

 

As mudanças serão incluídas em projeto a ser enviado esta semana ao Congresso que faz mudanças no IR. O projeto está sob análise do Palácio do Planalto e ainda poderá sofrer mudanças.

 

Permaneceremos atentos as alterações e novidades quanto ao tema e, assim que encerrada a análise pelo Planalto, traremos atualizações acerca das decisões.

 

Colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para maiores consultas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outros esclarecimentos.

 

 

Porto Alegre, 23 de junho de 2021.

 

 

Benoni Bernardes Brizolla

Estagiário de Direito

Departamento Tributário e Administrativo


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21/06/2021

EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO DEVEM PARTICIPAR DA FASE DE CONHECIMENTO DO PROCESSO TRABALHISTA

O Supremo Tribunal Federal julgou nesta terça-feira, em 14 de setembro de 2021, o Recurso Extraordinário nº 1.160.361-SP interposto em face de um acórdão do Tribunal Superior do Trabalho que admitiu a inclusão de empresa pertencente ao mesmo grupo econômico do empregador condenado no polo passivo da execução, mesmo sem ter participado da fase de conhecimento.

 

O Ministro Gilmar Mendes deu provimento ao Recurso Extraordinário para cassar decisão recorrida e determinar que outra seja proferida, com observância do artigo 97 da Constituição Federal de 1988, in verbis: “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público”.

 

Para o Ministro Relator, com o advento do Código de Processo Civil de 2015, a viabilidade de promover-se a execução em face de executado que não integrou a relação processual na fase de conhecimento, apenas pelo fato de integrar o mesmo grupo econômico para fins laborais merece ser revista, em virtude do que determina o art. 513, §5º do CPC: “O cumprimento da sentença não poderá ser promovido em face do fiador, do coobrigado ou do corresponsável que não tiver participado da fase de conhecimento”.

 

Desta forma, entendeu que o Tribunal de origem desrespeitou a Súmula Vinculante nº 10 do STF [1], e, por consequência, a cláusula de reserva de plenário, do art. 97 da Constituição Federal. Vejamos o trecho da decisão:

 

[...] Nesse sentido, ao desconsiderar o comando normativo inferido do §5º do art. 513 do CPC, lido em conjunto com o art. 15 do mesmo diploma legal, que, por sua vez, dispõe sobre a aplicabilidade da legislação processual na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, o Tribunal de origem afrontou a Súmula Vinculante 10 do STF e, por consequência, a cláusula de reserva de plenário, do art. 97 da Constituição Federal. Eis o teor do enunciado sumular:

"Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte." Por essa razão, o Tribunal a quo incorreu em erro de procedimento. Sendo assim, reconhecida essa questão prejudicial, faz-se imprescindível nova análise, sob a forma de incidente ou arguição de inconstitucionalidade, pelo Juízo competente, antes da apreciação, por esta Corte, em sede de recurso extraordinário, da suposta violação aos arts. 5º, II, XXXV, LIV e LV, do texto constitucional.

 

Essa decisão modifica a jurisprudência existente no Tribunal Superior do Trabalho e nos Tribunais Regionais Trabalhistas do Brasil, bem como cria um precedente para as execuções trabalhistas em curso, uma vez que desde 2003, com o cancelamento da Súmula nº 205 do TST [2], a justiça trabalhista tem como prática incluir empresas que participariam do mesmo grupo econômico apenas na fase de execução.

 

É importante lembrar que o Código de Processo Civil pode e deve ser utilizado como fonte subsidiária quando não há previsão na lei trabalhista, nos termos do que determina o próprio art. 769 da CLT [3].

 

Trata-se, portanto, de um precedente importantíssimo para as empresas no âmbito trabalhista, uma vez que a norma do Código de Processo Civil (art. 513, § 5º) não vem sendo aplicada pelos Tribunais do Trabalho, de forma que a partir dessa decisão o grupo econômico precisa estar inequivocadamente caracterizado na fase de conhecimento para que uma empresa do mesmo grupo econômico da Reclamada principal responda pela dívida na fase de execução.

 

Por fim, colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para dúvidas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outros esclarecimentos.

 

Porto Alegre, 20 de setembro de 2021.

 

Jéssica Veroneze Duarte

OAB/RS 118.221

Advogada – Departamento Trabalhista

 

 

[1] Súmula Vinculante 10 do STF. Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.

[2] SÚMULA Nº 205 TST (cancelada). GRUPO ECONÔMICO. EXECUÇÃO. SOLIDARIEDADE. O responsável solidário, integrante do grupo econômico, que não participou da relação processual como reclamado e que, portanto, não consta no título executivo judicial como devedor, não pode ser sujeito passivo na execução.

[3] Art. 769 da CLT. Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.


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